Um homem de 34 anos que se apresenta como músico amador foi preso em Pelotas por policiais civis da Delegacia de Combate à Intolerância (DPCI) de Porto Alegre. Ele é acusado de proferir ameaças e discurso de ódio de caráter neonazista e antissemítico. A ação foi coordenada pela delegada Tatiana Barreira Bastos, em mais uma etapa da operação Accelerare. Conforme os investigadores, o suspeito teria dito que já fez parte de célula neonazista, mas que atualmente não teria mais ligação com o grupo.
A polícia chegou até o suspeito após trabalho investigativo focado principalmente no monitoramento de grupos extremistas. Um celular e outros equipamentos eletrônicos foram apreendidos por agentes da delegacia na casa do suspeito. Entre os elementos que confirmariam o envolvimento com o crime estaria a própria saudação do e-mail pessoal do detido, com teor nazista, diz a delegada.
O homem é apontado como autor de ameaças de morte contra o professor Renato Borges, 40, em março deste ano, depois que este relacionou em rede social a banda norueguesa Mayhem, que se apresentaria em Porto Alegre, com o nazismo. Logo após a publicação do professor no Twitter, o deputado estadual Leonel Radde (PT), também de Porto Alegre, gravou um vídeo com o conteúdo e declarou que a banda é “abertamente neonazista”.
Por conta das denúncias, o show que seria realizado na capital foi cancelado, assim como a apresentação que ocorreria no Distrito Federal. Depois do cancelamento, a filha do deputado também recebeu uma mensagem, enviada a partir de um DDD de São Paulo, também ameaçando-a.
Recrutamento
“A ideologia utilizada pelo grupo tem como principal característica ser aceleracionista, pois visam colapsar o sistema e promover tumulto e ataques em locais públicos”, diz a delegada. Ainda conforme a investigação, a finalidade seria recrutar jovens nas redes sociais, atraídos por discursos nazistas e fascistas, direcionando-os a praticar crimes como ataques a escolas e espaços públicos.
O diretor do Departamento Estadual de Proteção a Grupos Vulneráveis, delegado Christian Nedel, acrescenta que o foco das investigações é cessar o aliciamento de menores colaboradores, desarticulando os grupos através das prisões das lideranças, monitorados pela Delegacia Especializada de Combate à Intolerância.
Exclusiva
Em entrevista exclusiva ao DP, o professor Renato Borges contou que foi ameaçado de morte em razão da denúncia que fez sobre as referências da banda norueguesa, que segundo ele, “tem relações estranhas com o nazismo que nunca foram esclarecidas” e também em razão de sua descendência judaica. Disse que de certa forma se sente mais seguro em saber da prisão do homem que o ameaçou. “Eu acredito em uma sociedade democrática e justa. Espero que o homem seja responsabilizado por seus atos conforme o previsto em lei. Pois há justiça e há consequências”, frisou.
Professor de Filosofia e Doutor em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Borges diz acreditar que as ameaças feitas a ele e a filha do vereador tenham sido do mesmo homem, pois há uma diferença de aproximadamente dez minutos entre uma e outra. “Eu recebi três ameaças. E uma delas com certeza é desse homem que foi preso em Pelotas.”
A vítima conta que a primeira sensação ao receber a ameaça, além de angústia e medo, remeteu à história de sua própria família. A bisavó de Borges, romena, fugiu de seu país de origem durante a Segunda Guerra Mundial, para o Brasil. “Como bisneto de uma sobrevivente judia, sinto tristeza e preocupação por isso ainda existir em nossa sociedade. Como pesquisador entendo e tenho visto indicadores, e não apenas uma percepção, de que a extrema direita vem crescendo nos últimos quatro anos em nosso País. Até em estados sem histórico, como os do Sul, o movimento vem ganhando corpo através de grupos neonazistas”, afirmou.
A investigação
No dia 6 de junho deste ano, foi deflagrada a primeira fase da Operação Accelerare, cumprindo quatro mandados de busca e apreensão nas cidades de Porto Alegre, Canoas, Nova Santa Rita e Novo Hamburgo. Foram presos três suspeitos e apreendido farto material de apologia ao nazismo e ao fascismo, como símbolos, literatura nazista, celulares, equipamentos eletrônicos, uma garrucha, simulacros de arma de fogo e munições de diversos calibres.
A operação tem objetivo de combater crimes de ódio e desarticular uma organização responsável pelo aliciamento de colaboradores via redes sociais, jogos e aplicativos de mensagens. A DPCI realizoutrabalho investigativo por cerca de seis meses, focado principalmente no monitoramento dos indivíduos, com apoio da Agência Brasileira de Inteligência (Abin).
Deixe seu comentário